quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Pirataria no Cinema




Eu tenho dado muita ênfase no mercado fonográfico porque é muito difícil tratar de todos os aspectos e exemplificá-los em todos os mercados ao mesmo tempo. Ficaria confuso e mais longo ainda. Assim eu tenho usado o mercado fonográfico como um exemplo, mas muitas das explanações e argumentos que são válidos para a indústria musical também podem ser extrapolados aos outros distintos mercados (software, livros, fotografia, TV e cinema). Mas outras colocações não. Assim cada mercado necessita de uma abordagem específica sobre o tema.

Mesmo no mercado audiovisual como um todo, temos que dividi-lo em TV, Cinema (DVDs) e Cabo. Por que esses têm modelos de negócio distintos requerendo assim abordagens também específicas. Neste post eu vou falar do Cinema e DVDs de filmes.

Existem algumas diferenças enormes na produção e consumo de filmes e música. Os filmes são muito mais caros de serem produzidos, mas tem uma vida mais curta. A não ser que você seja um cinéfilo, uma criança, ou um fã alucinado por um determinado filme, a maior parte das pessoas assiste o mesmo filme cerca de 5 vezes em toda sua vida em média. Não é um calculo científico, mas empírico. Você pode ver no cinema, depois eventualmente você aluga, assiste na TV a cabo e uma vez mais uma reprise na TV aberta em um dia de chuva. Claro que se você gostar muito você pode ainda chegar a 10 ou 16 vezes. Mas a maior parte das pessoas consideraria isso muito. Os CDs e DVDs musicais pela sua natureza podem ser vistos/ouvidos centenas, talvez milhares de vezes.

Assim filmes têm um período curto para recuperarem os seus custos. Isso fica ainda pior no caso de grandes sucessos do cinema em que os custos dos mega salários dos atores, efeitos especiais e computação gráfica, promoção e distribuição podem chegar as centenas de milhares de dólares. Uma vez que são vistos perdem rapidamente seu valor, pois as pessoas vão demorar muito tempo para vê-los de novo e pagar por isso.

Mas os filmes também têm uma característica única, que é o lançamento nos cinemas, e as produtoras controlam rigidamente esse lançamento e a distribuição. Se um filme “vazar” para a internet em teoria poderiam ser perdidos milhões de potenciais espectadores e a receita proveniente disso, uma vez que se a pessoa já viu o filme antes do lançamento ela em teoria não veria de novo.

Mas a verdade é bem diferente do que afirmam os estúdios. Apesar de um grande lançamento poder chegar à centena de milhares de dólares os ganhos da indústria com o cinema também são estonteantes.

Peguemos o exemplo do filme Homem de Ferro (2008). Esse filme tem um custo estimado de US$ 140 milhões (fonte: http://www.imdb.com/), contudo no fim de semana de estréia 4.105 sessões geraram um faturamento bruto só nos EUA de US$ 102.118.668!

Ou seja, no primeiro fim de semana ele já praticamente recuperou todo o investimento. Terminou sua carreira no cinema com US$ 318 milhões nos EUA. No Brasil foram 2,.811.622 de ingressos vendidos a um valor sub estimado de R$ 5 você teria cerca de R$ 14 milhões de faturamento. Isso tudo ao mesmo tempo em que eram feitos downloads do filme e DVDs com filmagens feitas dentro do cinema vinham sendo vendidos a R$ 5 no camelô da esquina. Fica claro, portanto que um filme como esse arrecada antes das locações, DVDs e das vendas dos direitos para TV a cabo muito mais do que ele custa. Mesmo com a pirataria estando com vento em popa (sem trocadilhos).

Você pode estar pensando, mas nem todo filme é um sucesso. As produtoras têm que arrecadar mais para suprir os riscos dos eventuais fracassos de bilheteria. Vamos analisar a um mega fracasso então, como exemplo Waterworld (1995) com US$ 175 milhões de orçamento, só faturou US$ 88 milhões. Mas se você for ao site http://www.imdb.com/title/tt0114898/business e fizer as contas. Vai ver que em várias moedas apenas nos países listados (o Brasil não aparece na lista), o filme recuperou claramente o custo. Por exemplo, foram £ 8 milhões só no Reino Unido. O filme faturou ainda US$ 42 milhões em locações. Nada mau para um fracasso!

Tudo bem, você pode achar que os estúdios faturam muito para poder fazer filmes que não seriam “comercialmente tão rentáveis” como a Cor Púrpura de 1985, que faturou US$ 98 milhões para um custo de produção de US$ 15 milhões. Isso tudo só com cinemas e nos EUA. Ou Dogma de 1999 que foi um projeto alternativo e muito controverso (fazendo piada com temas religiosos, anjos assassinos e Deus em forma de mulher), foi uma produção de baixo custo para os padrões de lá. Foi um orçamento de US$10 milhões e que faturou 38. Mas a verdade é que normalmente o orçamento desses filmes mais “cabeça”, “controversos” ou “artísticos” é muito inferior e os estúdios em geral sabem o que estão fazendo tomam muito cuidado para não tomar prejuízo com esses filmes.

É claro que existem filmes como As Aventuras de Pluto e Nash (2002), com um orçamento de 100 milhões e que não faturou nem 6 milhões, e que nem com locação e DVD, Cabo e TV recuperou o investimento. Esse filme é listado no MSN news como o maior fracasso da história da indústria cinematográfica. Mas se o filme é ruim assim.... o estúdio deveria arcar com as conseqüências e não esconder sua ineficiência atrás de lucros exorbitantes. Curiosamente a Warner não anunciou nenhum problema ou o risco de falência depois de um prejuízo tão grande! Diferentemente do que aconteceu com a 20th Century FOX que quase fechou por causa de Cleópatra de 1963, com um orçamento de US$ 44 milhões (hoje 259 em valores corrigidos) faturou 26 milhões (153 corrigido), mas que com a carreira internacional, reprises no cinema por volta de 1970 já havia empatado. As locações em VHS mais as licenças para exibição na TV posteriormente fizeram o filme dar lucro!

Desculpe-me por fazê-los passar por todos esses dados e números, mas isso reforça os argumentos a seguir:

A indústria cinematográfica aprendeu com o passado e hoje sabe muito melhor que antes sabe produzir um filme e o fazer dar lucro (não estou analisando aqui os filmes feitos para TV ou distribuídos diretamente em vídeo, que tem uma lógica diferente vão ser temas de outros posts). Assim os filmes ao serem lançados em vídeo já se pagaram com a exibição só no cinema. Mesmo com a pirataria. Alguns filmes até se beneficiam dela. O Filme Tropa de Elite, 2007 que custou cerca de US$ 4 milhões (uma ninharia) faturou nos EUA US$ 8 milhões e R$ 17 Milhões no Brasil. Curiosamente o filme, “vazou” antes da edição final. As pessoas que baixaram/compraram o filme e depois quiseram ir conferir no cinema a versão final. Foi um dos maiores sucessos nacionais! O filme fez sucesso no Brasil e no exterior apesar de ter sido um dos filmes mais pirateados da história do cinema brasileiro.


A experiência de ver um filme no cinema é única. Mesmo pessoas que assistem a filmes piratas regularmente continuam indo ao cinema. A tela grande, o som surround, a pipoca e a experiência não podem ser igualadas a experiência em casa. Mesmo com a inovação das TVs de LCD e Home Theaters. Tecnologias como cinema digital que serão implementadas em breve vão tornar muito mais barato distribuir filmes, do que como é feito hoje com o celulóide. Outros recursos como telas gigantes IMAX (15 metros de altura), salas especiais, 3D vão tornar a experiência ainda mais rica.

Mas e as capturas feitas de dentro do cinema e os “vazamentos”? Eles sempre funcionam na realidade como uma espécie de amostra grátis, sem custo para a produtora. Quem assiste a um filme de ação em Tele Sync ou Screener (esse é o nome que eles dão a esse tipo de pirataria) está assistindo a um filme de baixa qualidade. No final das duas uma, ou essas pessoas não assistiram o filme no cinema de qualquer maneira, porque elas não se importam com a qualidade ruim e não pagariam pela experiência de ver no cinema, ou são tão loucos pelo filme que irão de qualquer maneira ao cinema assim que ele estréia ou então acabam comprando o DVD. Sim, se o sujeito é fã isso realmente acontece! Em realidade os Screeners acontecem por que há um atraso entre o lançamento nos cinemas e o DVDs. Talvez fosse mais interessante deixar o público decidir onde ele deseja ver o seu filme favorito, se na sala de estar ou na sala do cinema fazendo os lançamentos simultâneos de DVD e cinema. Mas é claro que isso seria abrir mão de parte dos lucros, entretanto acho que seria muito bom para todos. Experiências desse tipo demonstram excelentes resultados como o filme Bubble do diretor Steven Soderbergh.

Hoje a exibição em cinemas é capaz de sozinho manter a indústria cinematográfica. Mas seria necessário que as produtoras repensassem suas estratégias de custos produção. Pagar salários de milhões de dólares para ter esse ator ou aquela atriz, não é na realidade uma coisa necessária. Isso acontece por que os atores muito famosos sabem dos lucros e pedem somas exorbitantes e acabam sendo atendidos. Alfred Hitchcock era famoso por contratar atores pouco conhecidos para época e por cachês mais realistas. Nem por isso seus filmes eram ruins ou os atores se sentiram menos recompensados.

A indústria também sabe que mesmo que a história seja um pouco ruim, a mistura certa de efeitos especiais, explosões e computação gráfica são capazes de fazer quase todo filme dar lucro mas os custos também aumentam. Assim eles focam menos na estória e mais na pirotecnia. Enquanto isso os roteiristas seguem sendo mal pagos a ponto de recentemente terem feito greve. Esses filmes “espetaculosos” atraem uma grande audiência, principalmente de jovens (que são maioria esmagadora nos downloads), e faturam alto. A ênfase em filmes desse tipo de filme saturou os cinemas com obras de qualidade artística e cultural pra lá de duvidosas. Reinam os filmes baseados em heróis de quadrinhos e batalhas espaciais (nada contra os gêneros), mas que consomem os recursos e retiram espaço de filmes com enredo de verdade prosperarem. Os filmes capazes de prender a audiência apenas pela estória e sem uma única explosão, sem apelar para os clichês, são raridade.

Conseguir fazer um filme com criatividade, inovação e um bom enredo sejam aceitos nesse ramo, é quase um milagre. Foram necessárias ao Steven Spilberg muitas batalhas, monstros do mar e caçadores de arcas para conseguir filmar a Cor Púrpura. Um filme que não teria aceitação dos estúdios, não fosse a pressão exercida pelo cineasta.

Portanto mesmo com a pirataria a indústria cinematográfica consegue pagar os custos de produção que são claramente exagerados. Mas ainda assim vende os DVD a 49,90 (Que é um preço cartelizado. Ou seja, sem concorrência! Isso é ilegal, mas ninguém denuncia.).

Existe uma “norma” tácita de distribuição. Um filme estréia nos cinemas, depois vai para DVDs e locação e payperview, só depois disso é que vai para o cabo e finalmente para a TV aberta. Nem sempre se segue esse esquema, mas após uns 2 ou 3 anos o filme já está na TV e o DVD pode ser comprado por algo entre R$ 15 e 19.

Há um tempo eu cheguei a encontrar a trilogia De Volta para o Futuro por R$19. Mais barato do que baixar da internet! Se você considerar o trabalho, a energia elétrica o provedor de acesso. Sai mais em conta!

Repare que isso não é encalhe. Isso é com lucro para o produtor. Mas se dá lucro agora mais de 10 anos depois do lançamento do filme, por que não vendiam a esse preço quando foi lançamento? Os custos na haviam sido amortizados já no cinema? Quanto custa para produzir um DVD?

Os números variam de acordo com o tamanho do lote de produção. Nos EUA esse número é de US$ 1,30 para DVD e US$ 1,45 para Blu-ray considerando um lote de 10 mil peças (http://wesleytech.com/ – Blu-Ray x DVD cost analysis) . Você pode estar pensando... “Como é que é? Um Blu-Ray custa 1,45 para produzir e em um filme em que eles já amortizaram o custo de produção eles me cobram R$ 150 por um disco? Isso é roubo!”. É mesmo, da vontade de dizer isso.

Outra coisa que é intrigante é que devido à natureza dos filmes, um CD como Pink Floyd – The Wall pode ser encontrado por R$ 39,90*. Enquanto um DVD do filme pode ser encontrado a R$ 39,90* . Mas o DVD de Tootsie pode ser encontrado a 15,90*. Repare que este último requereu uma nova capa e nova prensagem por ser um lançamento e edição especial de aniversário de 25 anos com extras adicionais. Por que o Pink Floyd não custa um preço parecido? Por que o CD e o DVD custam a mesma coisa se o CD não traz imagens e o DVD tem qualidade de áudio superior?

A realidade é que todos poderiam custar 15,90! Todos tiveram seus custos de produção abatidos e os direitos já foram pagos inúmeras vezes. Mas por que faturar menos se eles podem faturar mais?

Por fim, o peço é 15,90 porque existem os custos de distribuição, logística, seguro, impostos sobre tudo isso. Mas se você distribuísse pela internet onde os custos de distribuição são próxmos de zero, e nem a mídia e nem a capa seriam necessárias, os impostos que chegam a 40% desse valor também já seriam tantos (base de contribuição menor e natureza de impostos menor), esse filme poderia ser vendido com lucro estupendo a R$ 2,00! Você poderia colocá-lo em um pool, como um serviço de TV on-demmand, pagando por mês para ter acesso ao catálogo e baixar qualquer filme quando quisesse e assisti-lo no conforto de sua casa. Algo como uma módica quantia e você teriam acesso a todos os filmes do catálogo, sem limite de download. Pagando as produtoras, proporcionalmente por filme baixado. Não sei se esse modelo fecharia, mas considerando que os custos de produção já foram recuperados seria uma fonte incrível de recursos para as produtoras.

É claro que no modelo atual elas lucram muito mais, e as produtoras vão lutar com unhas e dentes para mantê-lo da maneira que está.

Seria maravilhoso que Hollywood tivesse a mente aberta para as novas tecnologias e tentassem se enquadrar num novo modelo. É claro que isso afetaria mais que os lucros o controle da distribuição. Isso é tão importante que quando foi definido o formato dos DVDs o mundo foi fatiado em 5 regiões para que a distribuição pudesse ser feita e manipulada de maneira a maximizar os lucros das produtoras. A pirataria simplesmente implodiu esse modelo. Quando o VHS surgiu, uma das queixas das produtoras era que filmes originais eram importados e atravessavam as fronteiras, chegando nos mercados antes dos filmes nos cinemas. Para evitar isso foi criado o sistema de regiões nos DVDs, assim se você vai aos EUA e compra um DVD de um show para assistir no Brasil, o seu aparelho não vai conseguir reproduzi-lo (claro que os piratas deram um jeito nisso).

O que acontecia antigamente é que um filme passava nos cinemas às vezes anos de diferença da data em que eles eram lançados nos EUA. Em São Paulo e Rio os lançamentos até eram rápidos, mas nas cidades do interior a demora podia ser enorme. Assim filmes lançados nos EUA chegavam “importados” e eram legendados amadoramente e essas cópias abasteciam os vídeos-clube de todo o Brasil. Com a internet isso ficou ainda pior. Dias depois do lançamento, filmes já estavam circulando por aí.

Para evitar isso a indústria passou a fazer lançamentos simultâneos e mundiais. Filmes como Matrix Revolutions chegaram a estrear na mesma data que quase todo os países do mundo (5/11/2003) em todos os cinemas. Homem Aranha 3 foi ainda mais longe. Estreou em 20 de abril de 2007, enquanto nos EUA foi só 10 dias depois!!!

Quando que poderíamos imaginar que lançamentos de filmes aconteceriam antes aqui do que nos EUA?

Conclusão:

O custo de produção dos filmes é muito elevado e poderia ser mais barato. Assim só com a exibição nos cinemas é possível recuperar o investimento.

Os ganhos exagerados de Hollywood praticamente acabaram com os filmes com boas estórias dando foco na rentabilidade de filmes “espetaculosos”. Isso esconde a sua ineficiência quando produzem péssimos filmes.

A divulgação de cópias pirateadas (Screener) tem pouco efeito no faturamento do filme, por que são de baixa qualidade. Mas o “vazamento” pode inclusive ser benéfico.

Graças a pirataria a distribuição de filmes ficou mais ágil e temos até o privilégio de estréias antes dos EUA. A indústria teve que repensar seu modelo de distribuição.

Nix.

Referências de preços:
* The Wall (CD) 39,90 na videolar
http://www.videolar.com/ProdutoCD.asp?ProductID=012927&cod_sub_media=3906&WT.srch=1
* The Wall (Filme) 39,90 na Ferrs
http://www.ferrs.com.br/produto.asp?wprod=017164&par=buscape
*Tootsie 15,90 na starcineshop
http://www.starcineshop.com.br/sistema/ListaProdutos.asp?IDLoja=3769&origem=buscape&IDProduto=1547091&q=Dvd+Tootsie+-+Ed.+do+25%BA+Anivers%E1rio+(Dvd+Duplo)&1ST=1&Y=9163425737524

essas referências devem desaparecer rapidamente, mas foram pesquisadas.

4 comentários:

  1. é...cinema , qdo bem feito e reconhecido, é uma mina de ouro!

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  2. Realemnte cinema quando bem feito, e reconhecido.
    Pena que existe o contrabando, que acaba com grande parte do lucro do filme :/

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  3. Boa tarde Nix!

    Gostei muito do seu blog!

    Eu curto cinema e tenho sim meus favoritos, os quais já devo ter assistido até superar a média que você citou lá em cima.

    Bom, sinceramente, para mim, filmes com gastos astronômicos, geralmente os de aventura e por aí afora, eu assito no máximo umas duas vezes, não entram para minha listinha de afetos...

    PS.: Gostei muito desta postagem, você conseguiu ir a fundo no tema, foi super informativo!

    Kiso
    =*

    http://garotapendurada.blogspot.com/
    http://ocaoinfiel.blogspot.com/

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  4. Tava pesquisando no google e achei seu artigo, muito bom, parabéns!

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